A Tua Vontade é a Tua Vitória

30.9.08

A Floresta


  Estive um ano da minha juventude "dentro" da floresta. Uma floresta virgem que tanto nos dava o piar dos pássaros tropicais como os ruídos característicos dos gorilas de galho em galho ou atravessando as clareiras em grupos.

  Um ano onde a solidão imperava e os meus olhos aprenderam a olhar a vida de outra forma.

  Quando, numa clareira, olhava para o céu através das copas dessas árvores, sentia-me pequeno.   Somos uma ínfima parte de um Universo que está para além da nossa compreensão.   Nele não somos nada, nele somos tudo.

  Aprendi a respeitar e saber que ali a meu lado estava um ser humano que necessitava de nós como nós necessitávamos dele. É o dar e o receber.

  A floresta envolve não só a floresta em si, mas também quem dela depende, uma borboleta, um símio, um crocodilo, a água que por ela corre, as suas gentes e os seus costumes.

  Um dos aspectos interessantes numa floresta tropical é sem dúvida a chuva que de repente cai e, pouco depois, brilha um sol esplendoroso.

  Devido ao facto de ser uma floresta muito "fechada", as poças mantinham-se durante muito tempo sem se evaporar pois os raios solares não chegavam até elas.

  Os mosquitos aproveitavam para colocar os seus ovos e nós lá tínhamos que andar sempre com o mosquiteiro enrolado ao pescoço que era para quando nos deitássemos na mata evitar que eles nos picassem e nos transmitissem a malária, doença por vezes fatal.

Este é o gorila que habita a floresta onde estive. Um animal de respeito

  Uma vez íamos em patrulha à noite quando, de repente, vimos um vulto iluminado pela lua cheia, bem destacado na picada por onde avançávamos. Paramos para ver tão estranha personagem, e todos, pelo andar da criatura, pensávamos que era um gorila. Só que ele vinha na nossa direcção e tanto se aproximou que no silêncio da noite risos ecoaram, era afinal um camarada nosso.


  O nosso percurso era quase todo feito por picadas (trilhos abertos) mas na hora de dormir, enroscávamos nas nossas mantas de campanha, a cama eram as folhas secas das árvores e o céu o nosso tecto.


  Mulher cabindesa - Na família cabinda, a principal figura é a mãe, pois é ela que trabalha a terra - fonte básica de sustento da família, e gera os filhos que aumentam o poder do clã. As filhas são a base da continuidade e propagação do grupo e base da sustentação deste pelo amanho da terra. O homem dedica-se à caça, ao derrube de árvores de maior porte e à guerra. O Cabinda considera a actividade agrícola aberrante da sua dignidade.
E como eram lindas as cabindesas!...

 Umas das características das florestas são os seus sons e o seu silêncio. O restolhar de uma serpente, um pequeno rato no seu passinho apressado, o piar de uma ave, o quebrar de um galho e o silêncio que, de repente, se abate sobre este mundo.

  Parece que nesse momento tudo deixava de existir pois o silêncio era tal que também se ouvia.   Ouvir o silêncio!...

  Quantas vezes debaixo de uma árvore o ouvi. Até o vento, o ar em movimento, fica quedo como se o simples soprar, fosse um acto pecaminoso bulir com o espírito silencioso da floresta.

  Mas eis que de repente, como obedecendo a um chamamento, o som volta desta vez com mais força e vigor pois o espírito da morte tinha passado!...

11.08.2004

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